O natal de quem não tem
Lido de forma literal poderia ter a impressão de que me refiro à possibilidade de alguém não ter Natal. Ao contrário, penso naqueles que, como todos, não saltam da noite do dia 24 para 26 de dezembro, mas, que vivem estes dias, em que socialmente se festeja com fartura e, até mesmo, extravagância, no sofrimento, na carência e na miséria.
O pensamento de que enquanto celebramos há quem esteja sofrendo, faz com que muitas pessoas sejam reticentes e não apreciem as festas natalinas e de fim de ano. Esta questão é levantada em dois contos que possuem um nexo íntimo entre si.
O primeiro é “A árvore de Natal na casa de Cristo”, de Fiódor Dostoiévski (1876), na qual é retratada a história de um menino que perambula pelas ruas na noite de Natal, com fome e com frio. Caminhando sob a neve de dezembro ele vê, da calçada, uma casa iluminada com a lareira acesa, luzes coloridas e piscantes iluminam o ambiente em que uma mesa farta está posta. Mas, o que atrai sua atenção é um enorme pinheiro enfeitado com presentes debaixo dele. O frio dá lugar ao entorpecimento e uma sensação de aconchego e sono. Ele diz: “Mamãe, vou dormir” e morre.
O segundo conto é “A pequena vendedora de fósforos”, do escritor dinamarquês Hans Christian Andersen (1848). A protagonista deste enredo, também é uma criança pobre, com frio e fome. Ela vende caixas de fósforo nas ruas, mas, nesta noite em questão, para atenuar o frio ela aninhou-se em um pequeno sulco e cobriu-se com palhas. Como não fosse o suficiente para abrandar o frio ela acende um palito de fósforo. Ela olha para a chama e lembra que, no Natal, que aconteceu uma semana antes, ela tinha visto pela vidraça de uma loja, uma árvore de Natal que brilhava com luzes. Este pensamento a fascinou e ela acendeu outro palito e outro mais, causando um incêndio. Enquanto se aquecia disse: “Vovó, leva-me consigo, sei que quando o fósforo se apagar vais desaparecer, como sumiram a estufa quente, o ganso assado e a linda árvore de Natal!”.
Dois contos. Dois autores de países diferentes. A mesma realidade e o mesmo desassossego diante da morte, do sofrimento e do luto em datas tão popularmente festivas. O que fazer diante de tal realidade? Como Jesus, neste dia, fazer-se presente na vida de uma pessoa! Se cada um cuidar de uma pessoa necessitada, a necessidade desaparecerá, ou, pelo menos, será atenuada. Faça deste Natal um momento de mostrar a quem não tem que Deus atua por meio de suas criaturas.
E, assim, tenha um Feliz Natal!
Sonia Sirtoli Färber
A autora, colaboradora desta Revista, é Tanatóloga e doutora em Teologia
clafarber@uol.com.br