Artigos › 19/01/2021

A pandemia da Covid-19 e as decorrências no sistema de saúde brasileiro

Um olhar para a realidade vivida em anos anteriores em comparação com o contexto atual.

Quando foi anunciada a pandemia da Covid-19, que chegou ao Brasil em março de 2020, a comunidade médica ficou perplexa e em estado de pânico. Afinal, não sabiam exatamente qual o grau de contágio do vírus e suas reais consequências. O certo é que contavam com um sistema de saúde frágil e insuficiente em número de leitos e equipamentos para atender aos infectados.

Além de todos os agravantes da Covid com relação aos problemas respiratórios, no Rio Grande do Sul, mais especificamente, a situação complica-se nos meses de inverno, o que faz com que, todos os anos, o número de pessoas com problemas respiratórios virais e bacterianos lotem os leitos de hospitais para tratamentos de doenças decorrentes da forte exposição ao frio e umidade intensas, às quais as crianças e os idosos são as principais vítimas.

Nas décadas de 1970 e 80, houve, além destes problemas respiratórios, surtos de sarampo, difteria e meningite meningocócica. Este período também foi caracterizado pela poliomelite (paralisia infantil) que deixou graves sequelas. Estas doenças, entretanto, foram, mais tarde, superadas graças à disponibilidade de vacinas.

Após, nos anos de 1980 a 90, tivemos um surto pelo adenovírus (bronquiolite) em crianças menores de um ano, o que causou mais de 70 mortes somente na UTI pediátrica do Grupo Hospitalar Conceição, em Porto Alegre. Nesta ocasião, vale lembrar que existiam menos de cinco respiradores disponíveis na ala pediátrica do grupo hospitalar. A situação foi drástica, uma vez que, muitas vezes, por falta de leitos, crianças ficavam hospitalizadas e tinham de ser atendidas nos corredores do hospital.

Os meios de comunicação da época acompanhavam a situação e clamavam pela alocação de investimentos que pudessem amenizar o problema. Apesar de todos os pedidos e relatos de profissionais da saúde, não houve consenso quanto à necessidade de mais investimentos, principalmente nos períodos de inverno, o que poderia ter contribuído para a criação de hospitais de campanha ou modalidades alternativas de atendimento e tratamento de pacientes. Em função destas carências e debilidades no sistema de saúde, foram muitos os atestados de óbito que os profissionais médicos tiveram de conceder dentro do referido hospital.

Passados quase 40 anos, muitas destas doenças não mais se manifestam e não acarretam novos óbitos graças, principalmente, à existência de vacinas antivirais. Pasmos estamos, agora, em plena pandemia da Covid 19, vivenciando uma nova realidade, pois o mundo se sensibilizou, as autoridades médicas e políticas também e, felizmente, estamos acompanhando a aplicação de um montante nunca antes visto em investimentos para fazer frente ao problema.

Na quase totalidade dos estados brasileiros, os leitos de UTI e os respiradores ampliaram-se consideravelmente, o que não ocorreu somente nas capitais, mas em um número bastante grande de cidades do interior. Com a existência de uma grande quantia de capital para ser alocado em pouco tempo, houve espaço para a ocorrência de fraudes que, por ora, parecem estar sendo devidamente esclarecidas.

Às vezes, é preciso que o caos se estabeleça para que uma nova ordem seja constituída. Foi preciso que se instaurasse a pandemia para que estes investimentos fossem concretizados, o que será lembrado por muitos profissionais da saúde nos anos decorrentes, enquanto estiverem utilizando os mesmos para tratar seus pacientes.

Dentro desta nova realidade, espera-se que desapareça a necessidade de ambulâncio-terapia, o pedido de leito por meios de comunicação, por políticos ou por ordem judicial. Dos anos passados, ficou a dor e a lembrança das perdas vivenciadas e dos momentos difíceis que foram vencidos, diante de clamores por investimentos que não ocorreram ou que foram incipientes para resolver os problemas.

O ano de 2020 nunca será esquecido, nem por nós, tampouco pelas novas gerações. Foi, de fato, um ano muito difícil, cercado de dúvidas, angústias e incertezas, mas coroado por melhorias incrementais nos recursos hospitalares e clínicos para garantir melhores condições de tratamento à população. Resta, agora, desejar que a vacina chegue em breve e que consigamos vencer mais esta doença que colocou em risco tantas vidas e provocou tanta tristeza, além das inúmeras outras que foram perdidas em função do vírus. Existem várias empresas, universidades e laboratórios, empenhados incansavelmente no desenvolvimento de pesquisas para viabilizarem a vacina, o que cessará grande parte de nossas preocupações. Considerando-se todos os tipos de doenças que já podem ser combatidas graças às vacinas disponíveis, evitam-se, segundo dados da OMS, quatro mortes por minuto e poupam-se cerca de R$ 250 milhões por dia.

De alento, fica a certeza de que, em 2020, todos os cidadãos que procuraram recursos médico hospitalares tiveram acesso ao mesmo, cumprindo o que dispõe o artigo 196 da Constituição Federal Brasileira. Como sempre é válido refletir e extrair algo bom das diversas situações que vivenciamos, por mais difíceis que elas sejam, talvez este caracterize, de fato, o lado positivo da pandemia da Covid-19, a qual veio para modificar nossa vida, nossos hábitos e também as condições do sistema de saúde brasileiro.

O autor, Pedro Roberto Menegazzo, colaborador desta Revista, é médico pedriatra em São Jerônimo (RS).

A autora, Giovana Souza de Freitas, colaboradora desta Revista, é professora universitária de Doutora em Economia.

Texto publicado na edição de janeiro/fevereiro de 2021.

1 Comentário para “A pandemia da Covid-19 e as decorrências no sistema de saúde brasileiro”

  1. Paulo Jose Menegasso disse:

    Excelente texto sobre a pandemia do renomado medico pediatra e da doutora em economia.
    retrata que os inventimentos em saude preventiva podem ser bem mais vantajosos que a medicina curativa.
    excelente interpretação da pandemia e comparação de outros momentos de saude pública.

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