Artigos › 15/10/2023

A alegria de ensinar incita o desejo de aprender

“Ensinar é mais difícil que aprender porque  

ensinar significa: deixar aprender”. 

(Martin Heidegger)

 

 

 

É consenso que aprender é muito mais do que estocar informações. Aprendizagem pressupõe e exige o desenvolvimento de competências e habilidades. Por isso, aprender não é decorar ou memorizar. Aprender requer “aprender a aprender”. Nesse sentido, o papel do professor não é, de modo exclusivo, transmitir conhecimentos; mas facultar espaços de aprendizagem, a partir dos quais o estudante, com protagonismo e proatividade, conquiste conhecimento pela sua capacidade e interesse, tendo em conta o seu ritmo e o seu tempo próprio. O psicólogo Jean Piaget ensinou que a função do professor é a “de inventar situações experimentais para facilitar a invenção do seu aluno”.  Talvez, assim, a sala de aula tenha a chance de ser muito mais um oásis de alegria e prazer do que um espaço de tédio e dissabores.

Ensinar as perguntas

Além disso, o papel do professor, em última instância, não é ensinar certezas prontas, acabadas e definitivas, mas estimular os estudantes a fazerem as perguntas pertinentes para as quais as respostas ainda nem sempre estão prontas.

A aprendizagem precisa se mover pelas perguntas, pelos problemas e pelos desafios que lançam o estudante para a descoberta e para a construção de soluções. As respostas e as soluções encontradas, por sua vez, guardam a vocação de ser matéria-

prima para as próximas perguntas e, portanto, alimentar a continuidade da investigação e do debate.

Se o professor não fizer de sua aula uma oficina de perguntas, de questionamentos e de problemas que demandam soluções, não possibilita o desenvolvimento da inteligência do estudante, não mobiliza a sua imaginação e criatividade; apenas prioriza o exercício da sua memória, a qual é uma boa “simuladora da inteligência”. Treinar a memória é importante. Reduzir a aprendizagem à memória é, no mínimo, empobrecedor.

O educador brasileiro Rubem Alves, lembra que as escolas existem “não para ensinar as respostas, mas para ensinar as perguntas. As respostas nos permitem andar sobre a terra firme. Mas somente as perguntas nos permitem entrar pelo mar desconhecido”. As respostas são terra firme, contudo já foram outrora mar desconhecido. As respostas de hoje nasceram das perguntas de ontem. É claro que no início é indispensável ensinar as respostas, afinal de contas, precisamos de terra firme para nos apoiar. Ensinar aquilo que já sabemos é o primeiro passo da tarefa escolar, para que na sequência também possamos ensinar aquilo que ainda não sabemos. Se as respostas moram em uma ilha segura e limitada, as perguntas, por sua vez, desejam zarpar para o mar desconhecido e ilimitado.

 

A alegria de ensinar

Segundo o filósofo Platão, “para ensinar necessita-se de Eros”, isto é, de amor pelo conhecimento ensinado e pelos estudantes atendidos. O amor é uma variável indispensável para o ensino e para a aprendizagem. Ensinar com amor gera memórias afetivas, compromissadas e duradouras. A aprendizagem temperada com Eros é frutífera, sólida e engajada. As memórias estudantis jamais esquecerão aquele professor movido pelo Eros e que fez da sua sala de aula um campo de encantamento e de inspiração. Como bem notou o filósofo suíço Henri-Frédéric Amiel: “Estimular, inspirar [encantar], essa é a grande arte de quem pretende ensinar”.

Ensinar é de alguma forma um “seduzir o aluno para que ele deseje e, desejando, aprenda”.

A alegria de ensinar incita o desejo de aprender, ou seja, aulas prazerosas estimulam o desejo do encontro e celebram o prazer de aprender.  Assim, ensinar é transbordar alegria, isto é, ensinar é um caminho palmilhado no afeto até encontrar seu ápice na alegria. A alegria de ensinar é o sinal externo da paixão interna do professor.

Os estudantes somente vibrarão com aquilo que estão estudando se eles notarem que seus professores igualmente vibram intensamente com aquilo que ensinam. Sobre isso Rubem Alves é certeiro na sua observação: “Pois o que vocês ensinam não é um deleite para a alma? Se não fosse, vocês não deveriam ensinar. E se é, então é preciso que aqueles que recebem, os seus alunos, sintam prazer igual ao que vocês sentem. Se isso não acontecer, vocês terão fracassado na sua missão”.

Os professores até podem declarar que ensinam com Eros e com alegria, mas somente os seus alunos, talvez, estão na posição privilegiada de aferir se aquilo que os professores ensinam é, de fato, um deleite para a alma. (Para quem gosta de cinema, os filmes Sociedade dos Poetas Mortos e Escritores da Liberdade oferecem uma boa amostra do ensino inspirado no Eros e no deleite para a alma).

 

tamar Luís Gelain

O autor, colaborador desta Revista, é doutor em Filosofia pela
Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Professor no Centro
Universitário – Católica de Santa Catarina (CATÓLICASC).
itamarluis@gmail.com

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