A inviolabilidade do sigilo sacramental.
Em 29 de junho de 2019, a Penitência Apostólica emitiu uma nota sobre a importância do foro interno e a inviolabilidade do sigilo sacramental. A Penitencia Apostólica, tribunal para o foro interno (www.penitenzieria.va) e o dicastério mais antigo de ajuda ao Papa, tem sua origem no final do século XII. Possui competências elencadas na Constituição Apostólica Pastor Bonus
(n. 117-120) sobre as matérias concernentes ao foro interno, tanto sacramental como não sacramental; concede as absolvições para alguns pecados reservados, as dispensas e as indulgências. Os confessores são os primeiros destinatários do Tribunal da Penitenciária Apostólica, porque devem tratar de alguns casos para os quais somente através desse Tribunal é possível a resolução.
A nota sobre a importância do foro interno e a inviolabilidade do sigilo sacramental começa com uma análise sobre o “desejo” de informação sem critérios de autenticidade e veracidade presentes na cultura. Mesmo entre os católicos, frequentemente são empregadas energias preciosas na busca de “notícias” ou “escândalos” com metas e objetivos teatrais que certamente não pertencem à natureza da Igreja. Tudo isso em grave detrimento da proclamação do Evangelho a toda criatura e às necessidades da missão.
Nesse contexto, a nota reafirma que o sigilo do sacramento da penitência é inviolável e provém diretamente do direito divino revelado e está enraizado na própria natureza do sacramento, a ponto de não admitir nenhuma exceção no contexto eclesial, nem, menos ainda, na esfera civil. O confessor nunca pode, por qualquer motivo, “trair o penitente com palavras ou de qualquer outra forma” (cânon 983, § 1), bem como não é permitido ao confessor fazer uso do conhecimento adquirido na confissão, mesmo se o penitente der a permissão e independentemente da finalidade (cânon 984, § 1). O sigilo sacramental diz respeito a tudo o que o penitente acusou, mesmo no caso em que o confessor não conceda absolvição. O sacerdote tem ciência dos pecados do penitente na pessoa de Cristo, tanto que ele simplesmente “não sabe” o que lhe foi dito. No final da confissão, o sacerdote não invoca o perdão, pedindo a Deus que perdoe os pecados, mas absolve na primeira pessoa do singular: EU TE ABSOLVO DOS TEUS PECADOS. Na realidade, é Cristo quem perdoa.
Atualmente, em algumas regiões do mundo, diz a nota, há um movimento para obrigar os sacerdotes a revelar o segredo de confissão para salvaguardar as vítimas de violência. A ação da Igreja católica será sempre a de promover uma cultura de paz e de denúncia contra a violência. No entanto, qualquer ação política ou iniciativa legislativa que vise “forçar” a inviolabilidade do sigilo sacramental constituiria uma ofensa inaceitável contra a liberdade religiosa que não recebe sua legitimidade dos Estados, mas de Deus mesmo. Também constituiria uma ofensa contra a liberdade da Igreja, incluindo a liberdade de consciência de cidadãos individuais, tanto penitentes quanto confessores. Quebrar o sigilo sacramental seria o mesmo que violar o direito das pessoas que buscam o perdão dos pecados e acreditam que tudo será mantido sob o sigilo sacramental.
Para o foro interno não sacramental, de uma maneira particular, pertence a direção espiritual, na qual a pessoa confia seu próprio caminho de conversão e santificação a um sacerdote, a um consagrado(a) ou a um leigo(a). Todavia, também a direção espiritual exige o segredo por respeito à intimidade e à consciência das pessoas. Não é um sigilo absoluto como o do sacramento da penitência, mas é necessário o segredo que respeita a pessoa humana.
Em um tempo de comunicação de massa, em que podemos adquirir todas as informações desejadas, é necessário considerar o poder da palavra e seu poder construtivo, mas também seu potencial destrutivo. Os confessores precisam estar vigilantes para que o sigilo sacramental nunca seja violado e a confidencialidade necessária do exercício do ministério eclesial da direção espiritual seja sempre zelosamente guardada, tendo como único horizonte o bem integral das pessoas.
Padre Francesco Amoroso, em seu livro Dal nulla al tutto (p. 22-23), que está sendo traduzido para o português, descreve sobre a imprescindível figura do diretor espiritual no caminho de santidade de São Vicente. Pallotti tinha um encontro mensal com seu diretor espiritual e era como um olhar no espelho para aumentar a capacidade de examinar-se e sentir mais intensamente a necessidade de purificar-se. Rezava São Vicente: “Rogo a Deus para que se digne a infundir luzes e graças muito abundantes no meu diretor espiritual, para que me conduza com a maior brevidade a Deus por uma via que seja infinitamente santa, segura, perfeita e oculta aos olhos dos homens” (X, 9-10). De fato, obedecer ao diretor espiritual como intérprete da vontade de Deus é um exercício de esvaziamento do próprio eu, para que, no lugar do eu, Deus seja tudo.
É impossível não perceber a força interior que produz a certeza moral de obedecer a Deus e a vantagem objetiva que traz essa certeza, quando o diretor espiritual é uma pessoa de ciência teológica e santidade.
Portanto, com a nota sobre a importância do foro interno e a inviolabilidade do sigilo sacramental, a família palotina volta seu olhar para São Vicente Pallotti, modelo de confessor e de diretor espiritual, que respeitou o sigilo sacramental e o segredo não sacramental, mas também de penitente e de dirigido espiritual que confiou na Igreja em vista da salvação.
O autor Pe. Denilson Geraldo – SAC, é colaborador desta revista. É padre palotino, membro do Conselho Geral da SAC e Doutor em Direito Canônico.