Artigos › 02/11/2023

O QUE DIZ A IGREJA SOBRE A CREMAÇÃO?

Diante da difusão da prática da cremação em diversas nações, em 2016, a Congregação para a Doutrina da Fé, com a Instrução Ad resurgendum cum Cristo tratou novamente sobre o tema. Essa Instrução, no entanto, retomou um documento de 1963; bem como o que a Igreja ensina no Código de Direito Canônico de 1983.

 

Em resumo, a partir desses documentos, a Igreja passou a considerar a cremação como possível para os cristãos católicos e não mais contrária à fé.

A instrução afirma, entretanto, que “por razões doutrinais e pastorais”, a Igreja ainda prefere que se dê sepultura aos corpos dos cristãos defuntos, mas não proíbe a cremação (n. 1). Apresentamos, então, as razões doutrinais e pastorais da preferência pela sepultura, mas também, ao mesmo tempo, orientações sobre a cremação.

A ressurreição é a verdade culminante da fé cristã anunciada desde os primórdios do cristianismo. “Pela sua morte e ressurreição, Cristo libertou-nos do pecado e deu-nos a vida nova” (n. 2). Como princípio e fonte de nossa ressurreição futura, embora já ressuscitamos, de certa forma, pelo Batismo, com Cristo, esperamos ainda a ressurreição de nossos corpos. Teremos, é verdade, corpos transformados, transfigurados pela graça de Deus, mas cremos na ressurreição dos corpos.

Desse modo, para a Igreja, o sepultamento continua sendo “a forma mais idônea para exprimir a fé e a esperança na ressurreição corporal” (n. 3). Entretanto, a cremação “não impede à onipotência divina de ressuscitar o corpo” (n. 4). Por isso, ela é também uma prática aceita atualmente pela Igreja.

 

Conservação das cinzas

Todavia, alguns cuidados devem ser tidos no que diz respeito “à conservação das cinzas” (n. 1). A Igreja recomenda que os corpos ou as cinzas de nossos irmãos falecidos sejam sepultados ou depositados nos cemitérios ou em outros lugares sagrados (n. 3). Não é, pois, adequado, depois da cremação, espalhar as cinzas no ar, na água, em jardim ou em outros ambientes (n. 7). A Igreja também proíbe que as cinzas sejam divididas entre os familiares e amigos. A conservação das cinzas em casa também não é consentida, a não ser em casos excepcionais autorizados pelo bispo do lugar (n. 6). Assim que, “no caso de o defunto ter claramente manifestado o desejo da cremação e a dispersão das mesmas na natureza por razões contrárias à fé cristã, devem ser negadas as exéquias, segundo o direito” (n. 8).

Mas por que não é conveniente espalhar as cinzas de nossos falecidos? Saber que os restos mortais dos nossos familiares estão em lugar específico “favorece a memória e a oração” (n. 3), e ainda a “reflexão” (n. 5) sobre o sentido da morte e, por consequência, da própria vida ou, mais especificamente, sobre o modo como vivemos.

Com as cinzas no cemitério ou em outro lugar sagrado, podemos rezar por eles em um lugar específico. Sabemos que ‘estão’ lá. Isso é importante. A preocupação da Igreja é conservar um lugar de referência para oração e para recordação, dos familiares e da comunidade. Isso porque a oração pelos defuntos é parte fundamental do credo da Igreja. Ela tem por doutrina e ensina a comunhão entre os que peregrinam neste mundo e os que já alcançaram a glória ou estão em vias de alcançá-la. A oração frequente e recorrente é, deste modo, favorecida com a existência destes lugares de conservação dos restos mortais de nossos falecidos. Assim, existirá um lugar que favorecerá a oração pelo falecido mesmo depois da morte das pessoas que conheceram o defunto (n. 6). Ali a comunidade cristã poderá se reunir para rezar. E, isso mesmo, depois que tenha passado a geração dos que conheceram o defunto (n. 6). Com o lugar ‘onde estão’ sempre haverá um lugar referencial de oração para a comunidade cristã.

 

Dignidade do corpo humano

Ao sepultar os corpos ou as cinzas, a Igreja quer enfatizar a “grande dignidade do corpo humano como parte integrante da pessoa da qual o corpo condivide a história. Não pode, por isso, permitir comportamentos e ritos que envolvam concepções errôneas sobre a morte: seja o aniquilamento definitivo da pessoa; seja o momento da sua fusão com a mãe natureza ou com o universo; seja como uma etapa no processo da reencarnação; seja ainda, como a libertação definitiva da “prisão” do corpo” (n. 3).

Padre Juliano Dutra, SAC

O autor, colaborador desta Revista, é padre
Palotino e professor de História da Igreja na
Faculdade Palotina – Fapas, em Santa Maria (RS)
julianodutr@gmail.com

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