O poder do perdão
“Deus amou de tal forma o mundo, que lhe deu seu Filho único, para que todo o que n’Ele crer não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo 3,16).
Nós amamos porque Deus nos amou primeiro (cf. 1Jo 4,19). Somos constantemente perdoados por Deus, que nos amou primeiro. E, porque somos perdoados e amados por Deus, devemos também perdoar.
E qual a medida do perdão? Pedro chega para Jesus e faz essa pergunta: “Senhor, quantas vezes devo perdoar?” (cf. Mt 18,21). E é impressionante que Pedro faz a pergunta e sem esperar resposta, ele mesmo sugere: “Até sete vezes?” (Mt 18,21). Como ele foi afobado na resposta e mostrou que ele não compreendeu o mestre, Jesus explicou: “Oh! Pedro! Não sete, mas setenta vezes sete, isto é, sempre!” (cf. Mt 18,22).
É importante perceber isso. Perdoar muitas vezes a mesma pessoa, às vezes nos mesmos erros, nos mesmos equívocos, isso significa tolerância, isso significa misericórdia. Mas exige força de vontade e empenho, porque geralmente se trata de pessoas mais próximas. Primeiramente, porque as atitudes de terceiros não nos causam tanto sofrimento e decepção quanto aquelas de quem queremos bem e, por essa razão, não esperamos receber tratamento hostil ou deliberadamente prejudicial. Em segundo lugar, porque muitas vezes o perdão exige reconstruir a confiança, a convivência e o próprio relacionamento.
Sem querer ser egoísta ou estimular o egoísmo, ao perdoar não devemos nos preocupar se o outro vai mudar. Não nos preocupemos com os efeitos que o nosso perdão vai causar, se vai trazer a pessoa de volta, se vai restaurar a amizade ou se ela também vai nos perdoar. A reconciliação é uma consequência do perdão que nem sempre acontece. O amor para ser vivido precisa ser recíproco e o perdão pode ser unilateral. Não significa que o outro tenha que nos perdoar, significa que nós vamos perdoar, é diferente. O perdão deve ser algo gratuito, unilateral. Não se deve estabelecer condições para o perdão. Deus não age assim conosco e por mais egoístas, miseráveis e pecadores que sejamos, Ele nos perdoará sempre.
O perdão deve acontecer, principalmente, por se tratar de um preceito de Nosso Senhor. Vamos ser honestos, ao perdoar não agimos só movidos por amor, por complacência ou benevolência, perdoamos porque foi isso que Jesus nos pediu. Quem se fecha à graça do perdão fica preso ao passado, à dor, à magoa, à raiva e às vezes até ao desejo de vingança, sentimentos tóxicos que acabam bloqueando o futuro. Além disso, podem gerar doenças psicossomáticas, pois reduzem a imunidade do organismo e abrem espaço para as enfermidades oportunistas.
Há também aqueles que acham difícil perdoar, porque ainda não entenderam que perdoar não se trata de desculpar ou minimizar a ofensa sofrida e fingir que nada aconteceu. Agir dessa forma significa mascarar o problema, como colocar um curativo em cima de uma ferida que ainda contém sujeira. Ela pode até aparentar estar cicatrizada, mas por baixo da casca, a infecção permanece. Insisto: a ferida precisa ser raspada, sangrada, para haver cicatrização.
Desculpar não é perdoar. O perdão só cura quando reconhecemos a dor, conversamos sobre a ofensa e apesar de admitir ao outro que ele agiu mal e nos machucou, escolhemos não alimentar a tristeza, não guardar ressentimentos e em Deus, perdoamos suas fraquezas e limitações.
Pode parecer difícil, mas se fizermos de Jesus a nossa rocha firme, teremos a graça de conseguir perdoar e sermos perdoados.
O autor, colaborador desta Revista, Pe. Reginaldo Manzotti, é pároco reitor do Santuário Nossa Senhora de Guadalupe, Curitiba (PR).
Texto publicado na edição de abril de 2021.