Notícias › 27/02/2019

O lugar do outro

Colocar-se no lugar do outro com sinceridade é uma tarefa exigente. Muitas pessoas imaginam que estão sendo empáticas, quando, na verdade, torcem a questão para si mesmas e passam a ser o tema da conversa. Isso é muito fácil de ser percebido quando se está numa roda de bate-papo e alguém faz uma queixa. Seja a queixa que for irá deflagrar conexões mentais que, quase como uma necessidade, fará com que, espontaneamente, as pessoas passem a apresentar situações em que elas estiveram envolvidas em casos semelhantes, mas, com um diferencial, sempre em um nível mais intenso.

Parece que nas situações de estresse em que é difícil encontrar argumentos que aliviem o sofrimento do outro, paradoxalmente, as pessoas se tornam mais propensas a falar. Não falam porque têm o que dizer ou que o que tenham a dizer seja decisivo para fornecer ajuda, mas, ao contrário, por não darem conta de um tema que não conseguem explicar, falam de si mesmas.

Outra reação similar a esta é apresentar situações ainda mais difíceis e, às vezes, trágicas, que aquela apresentada por quem fez a queixa. Isso acontece até mesmo em visitas a convalescentes e doentes hospitalizados. Geralmente estas intervenções inapropriadas iniciam com a fórmula: “Aconteceu, também, com uma pessoa…” e, muitas vezes termina com a notícia que “esta pessoa” acabou mal. Fale que está com alergia e alguém falará de Jó se coçando com um caco de cerâmica; fale de goteira no telhado e replicarão com a narrativa de uma enchente; fale de uma doença e o outro contará sobre um velório.

Parece piada, mas não é. É a expressão da inabilidade social de colocar-se no lugar do outro. Porque ouvir o lamento do outro significa estar em situação de vulnerabilidade na qual o sofrimento do outro impacta em si mesmo e não há nada que possa ser feito. Lidar com a frustração da impotência diante da dor do outro faz com que as pessoas, na tentativa de sairemd daquele desconforto emocional, digam coisas inapropriadas e que, mesmo sem querer (e na maioria das vezes não quer) pareçam insensíveis.

Educar-se para a dor e o sofrimento nada mais é que educar-se. A mesma educação que nos modela para atuar nas várias situações sociais e de relacionamentos interpessoais é a educação requerida para acolher aquele que sofre. Se pensarmos assim, veremos que o que mais faz falta na sociedade é a capacidade de ser humilde a ponto de assumir e dizer que não tem resposta para a dor do outro, que não tem palavras para expressar o quanto o sofrimento do outro nos atinge e que somos incapazes de retirar dele esta dor.

Mas quando se consegue tal nível de autenticidade, a mágica do encontro acontece, pois quem sofre e partilha seu sofrimento, não espera que quem ouve lhe responda com discurso ou lhe dê a resposta para a dor. O que ela espera é empatia. Espera que o ouvinte possa se imaginar na sua posição e seja respeitoso. Foi assim que agiu Jesus diante do sofrimento humano. Ele não fez discursos, não culpou, não esclareceu nem deu resposta. Ele se colocou por perto. Fez-se próximo. E, no silêncio, assumiu a dor que dói no outro.

Colocar-se no lugar do outro é ser o rosto de Jesus na vida de quem sofre.

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