Artigos › 26/03/2018

Da turbulência à atitude do cuidado

Durante as férias de início deste ano estive visitando meus pais na minha cidade natal, em Palotina (PR). Vi uma cena belíssima que me chamou muito a atenção e que me motivou a escrever este artigo e, a partir dela, fazer nossa reflexão filosófica.

Algo muito simples. Quando cheguei na casa de meu irmão, vi duas crianças que brincavam com um carrinho. Elas puxavam este carrinho até uma parte mais alta e desciam correndo em cima do mesmo. Pelo tamanho, uma tinha uns oito anos e a outra uns cinco. Uma estava somente de calção e sem camisa. Brincavam e se divertiam. Olhei ao redor e não vi nenhum dos responsáveis perto. Brincavam sozinhas, despreocupadas e seguras de que nada, nem ninguém, iria perturbá-las.

Desta cena me brotou uma resposta, no mínimo reflexiva, para uma questão que há muito tempo venho me fazendo: “Como sabemos quando uma sociedade está moralmente doente”? A resposta que me surgiu: quando temos que cuidar as crianças dos adultos, em vez de os adultos cuidarem das crianças. E é mais grave ainda quando esta atitude é tão corriqueira que necessitamos de uma ordem legal e punitiva para coibir tais ações.

Uma sociedade que precisa proteger as suas futuras gerações dos próprios indivíduos que a constitui está fadada ao fracasso e até mesmo ao próprio extermínio.

Gostaria de retomar o que já falamos em outro artigo sobre um pensamento ético baseado sobre o cuidado. Esta atitude é hoje imperativa. Nosso mundo está demandando cuidado e responsabilidade. Se não transformarmos essa maneira de ser em valores e princípios, dificilmente evitaremos catástrofes em todos os níveis. Os problemas, nas suas mais variadas complexidades, só serão equacionados a partir de uma ética do cuidado e da responsabilidade coletiva.

Precisamos, no entanto, sermos educados para tal perspectiva. No artigo intitulado “O cuidado de si para o cuidado do outro”, da cirurgiã-dentista Karla Patrícia Cardoso Amorim, em suas considerações finais, diz que “há uma necessidade urgente de uma educação para o cuidado, em todos os níveis, áreas e disciplinas, que oriente o homem a se voltar para o seu interior e promover a difícil, porém, possível tarefa de se enxergar e buscar melhorar-se intimamente, fato que implicará a capacidade de resistência à nossa barbárie interior – batalha mais difícil e que, ao longo de toda a história da civilização ocidental, foi deixada de lado. Acreditamos que a reforma íntima de cada um irá repercutir em uma transformação do meio externo, contribuindo para um mundo melhor”.

Faz-se urgente repensarmos muitas atitudes na nossa sociedade. É sabido que só haverá mudança na realidade que nos circunda se houver mudança nas atitudes dos sujeitos que vivem em tal sociedade. Há uma grande corrente de indignação e até revolta com vários fatos que estão acontecendo. Porém, há a necessidade de repensarmos nossas ações diárias frente a estes fatos. Não é suficiente, e até mesmo salutar, nos indignar e nos revoltar, sem darmos um passo mais adiante, que pode ser o do cuidado e da responsabilidade.

Ir. Leandro Carlos Benetti SAC

profleandropallotti@gmail.com

Deixe o seu comentário





* campos obrigatórios.