Evangelho em sua vida – Dezembro 2017
03 DE DEZEMBRO | 1º DOMINGO DO ADVENTO – ANO B
VIGIAI: NÃO SABEIS QUANDO O DONO DA CASA VEM
Is 63.16b-17.19b; 64 18,2b-7 | Sl 79 | 1 Cor 1,3-9 | Mc 13,33-37
Roxo | I Semana do Saltério
O Advento é um tempo de graça (kairós) que anuncia a boa notícia da vinda do Senhor ao nosso encontro. As leituras bíblicas nos estimulam a viver este tempo na alegre expectativa, empenhados no cumprimento da nossa missão, alimentando o desejo de que, neste Natal, nossa nação e o mundo inteiro se abram para acolher a paz que vem de Deus.
A primeira leitura contém uma bela e apaixonada súplica que brota do coração de um povo sofrido e sedento do amor de Deus. O texto imediatamente precedente ao que lemos hoje (Is 63,7-11) apresenta uma oração por meio da qual o povo de Israel se dirige a Deus recordando os grandes feitos do passado, nos quais Deus manifestou o seu amor e a sua misericórdia. Nesta leitura, faz-se referência à profunda situação de miséria em que vivia o povo (talvez no imediato pós-exílio). A comunidade orante implora a ajuda de Deus para que, assim como no passado, também no presente intervenha, manifestando o seu amor de Pai e de redentor. O texto litúrgico começa no ponto em que a comunidade orante confessa que Deus é um Pai que salva: “Tu, Senhor, desde sempre, nosso redentor é o teu nome”. Os dois títulos empregados para se dirigir a Deus aparecem em perfeita conexão, indicando que a paternidade de Deus se manifesta no empenho em resgatar os seus filhos de toda e qualquer situação de opressão e de miséria. O termo redentor (goel) evoca um importante aspecto da Bíblia Hebraica, segundo o qual compete ao parente mais próximo o dever de resgatar um dos seus que tivesse caído em extrema pobreza (Lv 25), bem como o dever de proteger a viúva (Rt 4), ou de vingar um parente assassinado (Nm 35,19-30). Aqui, o termo goel assume a função de recordar a Deus o seu compromisso de parente mais próximo (Pai) e intervir, resgatando o seu povo das mãos de tudo o quanto o escraviza.
Depois, a oração se torna acusação, como se fosse Deus o culpado dos males que recaem sobre o povo: “Por que, Senhor, nos deixas andar longe dos teus caminhos e endurecer os nossos corações?” Esta pergunta deixa transparecer uma situação vital na qual o povo se sente abandonado e imerso em um lamaçal de injustiças, situação da qual não poderá sair senão por meio de uma intervenção divina. Por isso, continua o orante: “Retorna, Senhor, por amor dos teus servos”. É um pedido que reflete a consciência de que há coisas que nos escapam completamente ao controle, não restando outra atitude que remetê-las a Deus. Uma oração assim só pode brotar de um coração simples e humilde, capaz de reconhecer as limitações e o próprio pecado.
O texto termina com um novo apelo, recordando uma grande verdade da qual nenhum ser humano pode fugir: “De fato, Senhor, tu és nosso Pai, nós somos argila, e tu aquele que nos plasma”. É, no fundo, uma expressão de total confiança em Deus. Diante de nossos limites, da certeza da caducidade dos nossos projetos, somente duas atitudes são possíveis: reconciliar-se com essa realidade, auxiliados pela sabedoria divina, ou abandonar-se ao ressentimento e à frustração de quem aprecia a vida como se essa fosse “uma paixão inútil”.
Esta reflexão nos prepara para acolher a sabedoria do Evangelho deste primeiro domingo de Advento.
O texto proposto conclui o “discurso escatológico” de Jesus em Marcos. No início deste discurso, que ocupa todo o capítulo treze, encontramos os discípulos deslumbrados com a grandeza e o esplendor do templo de Jerusalém, e Jesus os alertando para o fato que o mesmo está destinado a ruir, de modo a não se deixar “pedra sobre pedra”. Tal profecia motivou a pergunta dos discípulos: “Quando será isso e qual o sinal de que tudo isso estará para se cumprir”? Nos versículos 3-23, Jesus responde a segunda parte da pergunta e indica quais os sinais precursores do “cumprimento dos tempos”, que consiste na vinda gloriosa do Filho do Homem. Em seguida, Jesus retoma a primeira parte da pergunta: o “quando acontecerá”, primeiro com o exemplo da figueira, cujo ressurgimento das folhas anuncia inequivocamente a chegada do verão, e depois com o ensinamento sobre a vigilância, que é o texto da nossa leitura.
Logo no início, já encontramos este urgente apelo: “Estai atentos, vigiai, pois não sabeis quando é o tempo”. Aqui, o termo grego kairós não está indicando um tempo cronometrável; se assim fosse, as palavras colocadas nos lábios de Jesus seriam um discurso sobre o fim do mundo, mas não é o caso. O kairós anunciado por Jesus alude ao tempo estabelecido por Deus para cumprir os seus desígnios de salvar todo aquele que invocar o seu nome sobre a terra (Jl 3,5; Rm 10,13), e o seu cumprimento consiste na “vinda gloriosa de Cristo”, portanto, na plena realização do Reino de Deus. Ora, dado que este tempo oportuno é desconhecido pelos homens, é preciso estar alerta para não ser pego de surpresa, levando uma vida dissoluta e insensata. Para ilustrar a necessidade de vigiar a cada momento para não deixar fugir o kairós, Jesus apresenta o exemplo do “homem que parte em viagem” e confia a sua casa aos servos, cada qual com sua tarefa, e ao porteiro ele ordena que vigie, porque é incerto o momento em que virá o “dono da casa”. O texto conclui repetindo, pela terceira vez, o imperativo sobre a vigilância: “O que digo a vós, digo a todos: vigiai”.
A pergunta que o leitor é convidado a fazer a este texto, posto na abertura do tempo do Advento, é: por que o Evangelho insiste tanto no imperativo sobre a vigilância? Certamente nenhuma vigilância teria sentido se não existisse a esperança de um encontro. O Advento é justamente isso: preparar-se para um encontro, o mais importante e urgente de todos o encontro com Deus que vem a nós; vem completamente desarmado, como cordeiro em meio a lobos. Vem desarmado porque Ele nos traz é
a sua misericórdia e o seu infinito amor, e isso não se impõe à força. Quanto a nós, o único modo de acolher o amor e a misericórdia do nosso Deus, é recebê-lo completamente desarmados do ressentimento, do egoísmo e, sobretudo, do preconceito que nos impedem de abrir as portas da nossa casa para o Deus menino entrar.
Leituras da semana
Seg. Is 2,1-5 | Sl 121(122),1-4a.(4b-5.6-7.)8-9(R/. 1) | Mt 8,5-11. Ter. Is 11,1-10 | Sl 71(72),1-2.7-8.12-13.17 (R/. cf. 7) | Lc 10,21-24. Qua. Is 25,6-10a | Sl 22(23),1-6 (R/. 6cd) | Mt 15,29-37. Qui. Is 26,1-6 | Sl 117(118),1.8-9.19-21.25-27a (R/. 26a) | Mt 7,21.24-27. Sex. Gn 3,9-15.20 | Sl 97(98),1-4 (R/. 1a) | Ef 1,3-6.11-12 | Lc 1;26-38. Sáb. Is 30,19-21.23-26 | Sl 146(147A),1-6 (R/. Is 30,18) | Mt 9,35-10,1.6-8.
10 DE DEZEMBRO | 2º DOMINGO DO ADVENTO
ENDIREITAI AS ESTRADAS DO SENHOR
Is 40,1-5.9-11 | Sl 84 | 2 Pd3,8-14 | Mc 1,1-8
Roxo | II Semana do Saltério
Neste segundo domingo de Advento, as leituras bíblicas nos colocam no clima do evento escatológico, já na iminência da vinda do “Senhor da Casa”, como proclamava o Evangelho do domingo precedente. Hoje, somos motivados a reavivar a esperança e a reacender a fé na vida. Em um tempo como o nosso, marcado por tanta dúvida, desconfiança e pela sensação de impotência diante da violência e da corrupção que roubam o futuro de muita gente, é preciso fazer ecoar a Boa Notícia
(euaggelion) trazida pelos mensageiros de Deus: “Virá alguém mais forte”; “Ele vem com poder”. E quando ele vier e for acolhido, “a verdade e o amor se encontrarão; a justiça e a paz se abraçarão”. O autor de tão elevados dons vem como um pastor tão preocupado com as suas ovelhas a ponto de carregar no colo as que estão feridas. Mas, para que o encontro com este solícito pastor e Senhor da vida seja possível, é necessário “preparar no deserto o caminho”, isto é, reconhecer os nossos erros e nos converter dos nossos pecados, porque ele quer “falar ao coração” de cada um: “Sua escravidão terminou e estão perdoadas as vossas culpas”.
O texto da primeira leitura introduz a seção do livro de Isaías chamada “Livro da Consolação” sobre a cidade de Jerusalém. Estas páginas, que vão do capítulo 40 ao 55, foram escritas em um dos períodos mais atribulados da história daquela cidade. Tal situação é muito bem descrita no livro das Lamentações, onde a cidade de Jerusalém, caída em mãos do exército babilônico, aparece personificada na figura de uma mulher que acabara de perder o marido e os filhos, e por isso “chora incessantemente durante a noite, e as suas lágrimas correm-lhes pela face”. (Lm 1,1-2) O principal motivo do ininterrupto pranto desta viúva/mãe é a amarga constatação de que “não há nenhum que a console”.
São palavras que descrevem a situação de Israel após cair em mãos do tirano Nabucodonosor, rei da Babilônia; mas também podem servir para descrever a situação de muitas pessoas ao nosso redor, mergulhadas na solidão do vazio existencial. Eis, pois, que repentinamente a esta viúva/cidade desolada se anuncia uma grande notícia: uma misteriosa voz grita no deserto: “Consolai, consolai o meu povo, diz o vosso Deus. Falai ao coração de Jerusalém e gritai em alta voz que a sua tribulação se cumpriu… preparai no deserto o caminho do Senhor”. Ao introduzir o livro dessa forma, o profeta Isaías anuncia que a experiência da consolação reconduz ao núcleo da fé de Israel, à aliança na qual Yhwh firmou o compromisso de Ser o Deus do seu povo. A expressão “falar ao coração” manifesta a ternura e a empatia de Deus no confronto das pessoas que sofrem, sobretudo daquelas que sofrem as consequências dos próprios pecados. Semelhante imagem aparece num texto do profeta Oséias, onde apresenta Deus personificado na figura de um “marido traído”, e a nação simbolizada por uma esposa infiel: “A seduzirei, ao deserto a conduzirei, a falarei ao seu coração”. Tais imagens nos colocam diante de um Deus completamente despojado das armas da punição e da vingança, um Deus revestido de uma empatia tal a ponto de se inclinar ao coração do homem para falar-lhe palavras de conforto na hora do desespero e da dor, e convidá-lo a preparar o caminho que permitirá atravessar o deserto, símbolo da solidão, da privação da vida, mas também o lugar da oportunidade, da reflexão e da grandeza de reconhecer os próprios limites e então retornar para Deus.
O texto do Evangelho de Marcos retoma o tema do caminho a ser preparado no deserto que conduzirá ao encontro com o Senhor. A frase inicial apresenta o título que Marcos dá ao seu livro. Trata-se de uma “boa notícia”, que tem como protagonista “Jesus Cristo, Filho de Deus”. Que boa notícia é essa? A bela notícia que Marcos anuncia no seu Evangelho é que o lugar do reencontro com Deus se chama “Jesus Cristo”. Nele, e por meio dele, Deus revela sua opção definitiva e irrevogável pelo ser humano. É, ademais, por meio de Jesus Cristo, que doravante Deus fala ao coração do seu povo, para comunicar a sua misericórdia e o seu perdão.
Depois de anunciar o título e o conteúdo do seu livro, Marcos cita o Antigo Testamento, combinando tantos de diferentes lugares, porém coloca tudo sobre a autoridade do profeta Isaías: “Eis que envio o meu mensageiro diante de ti, que preparará o caminho diante de mim. Voz que grita no deserto: ‘Preparai o caminho do Senhor, endireitai as suas veredas’”. O fato de não se preocupar com a precisão literária das citações mostra que sua maior preocupação é que o leitor acolha, na fé, o que ele está para anunciar, pois se trata de um Evangelho, do qual a Boa Notícia é Jesus Messias, Filho de Deus.
A frase do Antigo Testamento, especialmente em
Is 40,3, é aplicada a João Batista, que vem apresentado como o mensageiro, a voz que grita no deserto, proclamando a urgência de preparar o caminho de Jesus.
A atividade de João é precisamente preparar o povo para acolher a missão redentora de Cristo, já operante, embora escondida na humanidade de Jesus. O ponto culminante da catequese de João era o batismo de conversão para o perdão dos pecados em vista de acolher o “mais forte”, que batizará com o ‘‘Espírito Santo”.
A principal mensagem deste domingo de Advento é que, em Cristo, Deus Pai cumpriu sua promessa de não deixar o homem abandonado no seu pecado; refém de um destino de morte. Em Cristo Jesus, ele nos propõe um novo caminho, desta vez, definitivo. É através deste caminho que o Senhor quer reconduzir a si todos e cada um de nós. Por isso, a melhor atitude a assumir neste início de Advento é aquela que encontramos no início do Salmo de hoje: “Quero ouvir o que o Senhor irá falar; é a paz que ele vai anunciar”.
Leituras da semana
Seg. Is 35,1-10 | Sl 84(85),9ab-14 (R/. Is 35,4d) | Lc 5,17-26. Ter. Gl 4,4-7 | Sl 95(96),1-3.10 (R/. 3a) | Lc 1,39-47. Qua. Is 40,25-31 | Sl 102(103), 1-4.8.10 (R/. 1a) | Mt 11,28-30. Qui. Is 41,13-20 | Sl 144(145),1.9-13ab (R/. 8) | Mt 11,11-15. Sex. Is 48,17-19 | Sl 1,1-4.6 (R/. cf. Jo 8,12) | Mt 11,16-19. Sáb. EClo 48,1-4.9-11 | Sl 79(80), 2ac.3b.15-16.18-19 (R/. 4) | Mt 17,10-13.
17 DE DEZEMBRO | 3º DOMINGO DO ADVENTO
NO MEIO DE VÓS, ESTÁ AQUELE QUE VÓS NÃO CONHECEIS
Is 61,1-2a.10-11 | Lc 1,46-50.53-54 | 1Ts 5,16-24 | Jo 1,6-8.19-28
Roxo ou Rosa | III Semana do Saltério
Os textos bíblicos do terceiro domingo de Advento estimulam uma reflexão a respeito da figura do mensageiro de Deus, chamado a testemunhar a luz divina no mundo e a fazer germinar, no coração dos homens, a semente da esperança.
Na primeira leitura, escutamos um texto tirado do capítulo 61 de Isaías, onde encontramos a emblemática figura de um locutor que se apresenta em primeira pessoa falando de si mesmo. Pouca coisa se sabe desse personagem, a não ser que é dotado do espírito do Senhor e que é “ungido” (māšîa, “messias”) em função de uma missão portadora de consolação. Ele define resumidamente a sua obra como uma “Boa Notíca” (euaggelion) para os pobres (anawîn). Esta mensagem ecoa na época do
pós-exílio, em que Israel tenta se reerguer da catástrofe que foi o cativeiro babilônico e da destruição de Jerusalém e do seu templo, que era o lugar do encontro com Deus. Mas como todo recomeço é difícil, muitas pessoas, recém repatriadas, achavam-se sem força e sem motivação para levar adiante tal obra de reconstrução. Mas é justamente neste clima de desconfiança e desânimo que Deus faz ecoar essa mensagem de alegria e de libertação, das quais o verdadeiro protagonista é o “Espírito do Senhor” que atua no mensageiro de Deus. Por isso mesmo, o sucesso da obra está garantido, porque sustentada, não pelos poderosos deste mundo, mas pela dinamis, o poder de Deus. Não podemos esquecer que foi justamente deste texto que se serviu Jesus, na sinagoga de Nazaré (Lc 4), para interpretar a sua atividade messiânica como um serviço aos pobres, categoria de pessoas que, na Bíblia, sempre vem apresentada como interlocutora privilegiada de Deus, porque aberta a escutar sua voz e pronta a confiar a sua causa e o seu destino nas mãos de Deus. É este o ponto onde encontramos a mensagem central do texto de hoje: em meio a uma humanidade sofredora, o mensageiro de Deus é enviado para anunciar a salvação, “o ano da graça do Senhor”. A imagem do germinar da semente, com a qual o texto se conclui, chama a atenção para o fato de que a fé, a justiça, a paz e a verdadeira liberdade não viajam por asas de prodígios extraordinários ou pelas grandezas deste mundo, mas são como a semente plantada numa terra irrigada.
Como acolher este dado da revelação divina em meio a tão sofisticados aparatos de poder que muitas vezes são colocados em função de perpetuar injustiças, privilégios e espalhar a dúvida ou até mesmo criar falsas esperanças no coração do povo?
A passagem que constitui o Evangelho de hoje nos permite aprofundar um pouco mais a mensagem da primeira leitura. O texto que escutamos é centrado no testemunho de João Batista, que fala de si mesmo e daquele que vem depois dele. O primeiro elemento que vem sublinhado pelo evangelista é que João não é apresentado como o precursor, mas como “testemunho”: o portador de uma verdade por ele conhecida e assimilada na própria vida. Em seguida, João Batista é chamado a dar as razões do seu testemunho na presença dos membros do sinédrio. É de se notar como, deste o início da narração do Quarto Evangelho, se vai desenhando o confronto entre aqueles que acolhem o Verbo, luz do mundo, e aqueles que preferiram permanecer nas trevas. Isto se verifica no contraste entre os que se aproximam para receber o batismo de conversão oferecido por João e os que, a mando das autoridades, vem para investigar o que está se passando, movidos pelo medo de perder o controle da situação. Isto mostra como, desde o princípio, a verdade do Evangelho encontra resistência por parte de tantos que se incomodam com o brilho da sua luz.
É interessante notar como João responde aos seus inquisidores, com plena consciência dos limites de sua missão e da verdade de sua própria condição: Eu não sou o Cristo, nem Elias, nem o profeta. Mais adiante, João Batista aparecerá radiante de felicidade ao ver que sua missão foi cumprida e que o seu testemunho conduziu as pessoas a Jesus (Jo 3,27-30). É justamente nisso que está a eficácia de uma missão: quando o mensageiro de Deus aceita aquilo que é e não cai na tentação de querer ocupar um lugar que não é o seu. Ao responder positivamente, João se autodefine “uma voz que grita no deserto: aplainai o caminho do Senhor, como disse o profeta Isaías”. Chama atenção o uso do artigo indefinido a indicar que a verdadeira voz que deve ser ouvida é a de Cristo, porque ele é o Verbo de Deus feito carne. A nós, compete escutar esta voz e obedecer ao seu comando para viver “a alegria do Evangelho”, a mesma alegria que Paulo augura aos Tessalonicenses, na segunda leitura, e da qual faz eco o canto do responsório de hoje, colocado nos lábios da bem-aventurada Mãe de Jesus:
“A minha alma engrandece o Senhor, e o meu espírito exultou em Deus, meu salvador”. Somos convidados, neste Advento, a prestar menos atenção aos discursos estéreis e a abrir bem os nossos ouvidos para escutar a Voz de Deus e se tornar mensageiro da sua potente novidade.
Leituras da semana
Seg. Jr 23,5-8 | Sl 71(72),1-2.12-13.18-19 (R/. cf. 7) | Mt 1,18-24. Ter. Jz 13,2-7.24-25a | Sl 70(71),3-4a.5-6ab.16-17 (R/. cf. 8a) | Lc 1,5-25. Qua. Is 7,10-14 | Sl 23(24), 1-4ab.5-6 (R/. 7c.10b) | Lc 1,26-38. Qui. Ct 2,8-14 ou Sf 3,14-18a | Sl 32(33),2-3.11-12. 20-21 (R/. 1a.3a) | Lc 1,39-45. Sex. 1Sm 1,24-28 | (Sl) 1Sm 2,1.4-8 (R/. 1a) | Lc 1,46-56. Sáb. Ml 3,1-4.23-24 | Sl 24(25),4-5ab.8-10.14 | (R/. Lc 21,28) | Lc 1,57-66.
24 DE DEZEMBRO | 4º DOMINGO DO ADVENTO
EIS QUE CONCEBERÁS E DARÁS À LUZ UM FILHO
2Sm 7,1-5.8b-12.14a.16 | Sl 88 | Rm 16,25-27 | Lc 1,26-38
Roxo | V Semana do Saltério
Estamos no último domingo de Advento, poucas horas nos separam do Natal do Senhor. As leituras bíblicas nos colocam no coração do mistério de Deus, isto é, do plano divino de salvação desde sempre preparado e de muitos modos testemunhado na história bíblica até encontrar sua plena realização no evento da encarnação do Deus menino.
A primeira leitura apresenta um capítulo importante desta história da manifestação do amor de Deus pela humanidade. O palco do episódio que escutamos é a cidade de Jerusalém, no tempo em que o reinado de Davi gozava do máximo esplendor. Esta cidade tinha sido escolhida para ser a capital do reino, fato que se consolidou quando Davi fez transferir para lá a “Arca da Aliança”. Até então, a Arca Sagrada habitava em tendas e peregrinava com o povo nas suas constantes andanças de nômade.
Considerando a bem-sucedida trajetória pessoal e as inúmeras conquistas do seu governo, Davi pensava em poder controlar inclusive as coisas que dizem respeito ao plano de Deus. Na sua cabeça de hábil guerreiro e poderoso político, era convicto que a iniciativa de construir uma “casa” estável para abrigar a Arca da Aliança e, portanto, para ser a morada definitiva de Deus junto ao seu povo outrora nômade, obedecia aos mesmos critérios de sua arte de governar. É a grande tentação que mais ou menos todo homem de fé pode sofrer: “Encerrar Deus nos recintos das instituições e do sagrado” e valer-se disso como lhe convém. É aí que entra o profeta Natã para recordar ao rei e a todo crente que não é possível, ao ser humano, ser o senhor de tudo, muito menos de dispor Deus ao seu
bel-prazer, enclausurando-o em esquemas mentais, sistemas e construções de quaisquer naturezas.
Com palavras colocadas nos lábios de Deus, o texto de Samuel reage a esta pretensão do rei Davi, recordando, antes de tudo, que sua história de sucesso não foi apenas por causa das suas habilidades pessoais, mas que teve assistência da graça de Deus: “Fui eu que te tirei do pastoreio para que fosses o chefe do meu povo, Israel. Estive contigo em toda parte, tornei o teu nome tão célebre como o dos homens mais famosos da terra”. Como o rei pôde ter esquecido disso? Da mesma maneira como nós, muitas vezes, esquecemos que somos pessoas de fé e só o recordamos diante das necessidades e das situações de perigo, ou quando já é tarde demais.
Depois desse choque de realidade, o texto de Samuel, jogando com o termo hebraico bayt “casa”, “descendência”, faz outra solene declaração: “Quando os teus dias se cumprirem e repousares com teus pais, eu suscitarei, depois de ti, um descendente, um filho teu, e consolidarei o teu reino… A tua casa e o teu reino serão estáveis para sempre diante de ti, e o teu reino será firme para sempre”.
É à luz desta promessa que o texto do Evangelho de hoje assume toda sua força comunicativa e nos permite mergulhar ainda mais fundo naquele misterioso desígnio de Deus, mantido em sigilo desde sempre e agora manifesto em Jesus Cristo (segunda leitura).
O texto proposto apresenta a cena da anunciação a Maria. Nesta passagem, Lucas convida o leitor a acolher a encarnação do Verbo divino, no seio da Virgem Maria, como a realização daquela promessa feita ao grande rei Davi.
Já na exposição do episódio, que serve para situá-lo no tempo e apresentar os personagens, encontramos ao menos dois dados interessantes: a cena da anunciação não se passa no templo, mas numa casa; Maria, a destinatária do anúncio, não faz parte de família sacerdotal, mas é apenas uma “jovem” (parthénos, “virgem”) contada entre os habitantes de uma pequena vila chamada Nazaré. Estes dados indicam, antes de tudo, que o chamado de Deus a Maria para ser a Mãe de Jesus acontece lá onde ela desempenha o seu trabalho, na cotidianidade da vida, na “laicidade do mundo”, e que a casa estável prometida a Davi não é obra de mãos humanas, mas da liberdade e da graça de Deus. Isto se confirmará no desenvolvimento do diálogo entre o anjo e Maria.
Ao saudar Maria, o anjo a nomeia “cheia de graça”, título que não se refere tanto à sua identidade, quanto a obra de Deus que está se cumprindo nela por meio do “Espírito Santo… o poder do Altíssimo”. É o próprio anjo Gabriel, no versículo 30, a dar a interpretação do título: Maria é privilegiada por ter encontrado “graça diante de Deus”. Esta alegre saudação do anjo prepara a revelação dos versículos 31-33 referente ao anúncio do nascimento de Jesus e a explicação do sentido do nome que lhe será imposto, um nome estritamente ligado à sua origem. Ele é o Messias esperado da casa de Davi, e o seu destino/missão será fundar os alicerces de um reino que não terá fim. Portanto, é na humanidade de Jesus que Deus realiza a promessa de construir uma casa estável e um reino sem fim, porque só ele é Deus, só a Ele pertence a plenitude. Ao ser humano cabe acolher, com humildade e simplicidade, o “mistério” de Deus e, a exemplo de Maria, interrogar “como” Deus quer que realizemos nossa missão. E a explicação só pode ser a mesma que o anjo oferece a Maria: é o Espírito criador de Deus que nos dará força e coragem para que o desígnio de Deus se cumpra em nós.
Tudo isso se propõe a cada um de nós como um estimulante convite a reconhecer como os planos de Deus estão muito acima dos nossos e, assim, nunca pensarmos que já estamos prontos, que já conquistamos tudo, ou que tudo esteja sob o nosso controle. A sabedoria do Evangelho nos ensina que precisamos estar sempre abertos às surpresas de Deus.
Leituras da semana
Seg. Is 9,1-6 | Sl 95(96),1-3.11-13 (R/. Lc 2,11) | Tt 2,11-14 | Lc 2,1-14. Ter. At 6,8-10; 7,54-59 | Sl 30(31),3cd-4.6.8ab.16bc.17 (R/. 6a) | Mt 10,17-22. Qua. 1Jo 1,1-4 | Sl 96(97), 1-2.5-6.11-12 (R/. 12a) | Jo 20,2-8. Qui. 1Jo 1,5-2,2 | Sl 123(124),2-5.7b-8 (R/. 7a) | Mt 2,13-18. Sex. 1Jo 2,3-11 | Sl 95(96),1-3.5b-6 (R/. 11a) | Lc 2,22-35. Sáb. 1Jo 2,12-17 | Sl 95(96),7-10 (R/. 11a) | Lc 2,36-40.
31 DE DEZEMBRO | FESTA DA SAGRADA FAMÍLIA
O MENINO CRESCIA E ENCHIA-SE DE SABEDORIA
Eclo 3,3-7.14-17a | Sl 127 | Rm Cl 3,12-21 | Lc 2,22-40
Branco | Ofício Festivo
Convidamos os leitores a acompanharem esta reflexão sobre a Sagrada Família, na matéria especial do presente mês, acessando o link abaixo.
http://revistarainha.com.br/natal-momento-de-celebrar-o-nascimento-de-jesus-cristo-e-vida-em-familia.html