Artigos › 01/08/2017

Pare, respire fundo, converse!

Poucas pessoas nascem com aquela pecinha do autocontrole inserida no disco rígido da nossa mente e funcionando perfeitamente. Congestionamento? Fila? Atraso de mais de uma hora do médico? Uma parcela da conta de telefone que veio errada? Um vizinho que ouve música muito alta? Não importa. Esses dilemas cotidianos que todos enfrentam não são capazes de mudarem o humor de quem pratica o autocontrole.

Mas essas pessoas aí são minoria. Grande parte fica brava mesmo, xinga, manda longe, roda a baiana, como diria a nossa expressão popular. É aquele sentimento de raiva que surge em apenas alguns segundos e sobe até a cabeça tão rápido que, quando mal se percebe, bum, explode-se!

O historiador americano Douglas Fields enumerou as causas que nos levam a explodir: integridade física, insulto, família, ambiente, sexo, ordem social, dinheiro, tribo e impedimento, esta última relacionada ao que nos tolhe, física ou psicologicamente, e causa a sensação de encarceramento. Ou seja, quase tudo (rsrsrs)! Quando algum desses fatores sente que pode estar ameaçado, o cérebro funciona como um escudo e abre a autodefesa. Explode.

“Todos temos esses ‘circuitos’ em nossos cérebros, porque os seres humanos se desenvolveram em uma natureza selvagem, em um ambiente em que sobrevive quem é o melhor. Nossos cérebros são os mesmos que tínhamos há cem mil anos, mas nosso ambiente é totalmente diferente agora”, explicou Fields.

Como também diria a talentosa cantora e compositora Elis Regina: “Ainda somos os mesmos e vivemos como nossos pais” (poderíamos substituir por “nossos ancestrais” que estaria certo também). Reagimos a situações como antigamente. Impulsivos, intolerantes e, hoje mais do que nunca, podemos adicionar: impacientes.

Não queremos esperar. Nada. Nem o garçom. Nem a porta da garagem do prédio abrir. Nem o elevador chegar. Nem o concurso chamar. Nem a mãe passar o sal na mesa. Nem o almoço ficar pronto. Nem o amor aparecer. Nada. Essa angústia faz a gente atropelar o ritmo natural da vida acontecer, ritmo esse, diga-se, que geralmente não é o mesmo que o seu.

Mas você já experimentou respirar fundo, conversar com a sua raiva e só dar vazão ao que estava pensando quando estiver totalmente dono de si novamente? Pense em alguém instintivo. Um descendente de italianos, por exemplo. Sangue quente. Impulsivo. Daquele que não filtra a vazão da raiva, simplesmente abre a torneira e deixa todo o sentimento sair. Quando percebeu, já era tarde. Quando percebeu, explodiu. Quando percebeu, o mal que causou não pôde mais consertar.

Você deve conhecer alguém assim. Eu conheço. E vi essa pessoa fazendo a experiência de respirar fundo e questionar o motivo daquela raiva. Por que mesmo estou tão nervoso? Por que aquilo que ele me falou me deixou assim? Qual é o motivo gerador dessa angústia? Desse mau-humor?

Cinco minutos. Ele se trancou no banheiro e ficou cinco minutos refletindo. Conseguiu entender e ver com clareza o que realmente o havia irritado. Enumerou mentalmente esses motivos. Quando saiu, conseguiu conversar. Numa boa. Tranquilo. Absolutamente dono de si.

O psiquiatra e escritor brasileiro Augusto Cury costuma dizer que precisamos aplicar uma técnica que ele denominou D.C.D:

Duvide de todo sentimento de incapacidade, da sua timidez, do seu complexo de inferioridade, de tudo que encarcera sua inteligência. Duvide que você não consiga vencer seu mau humor, sua insegurança, sua depressão, sua ansiedade, seu medo de percorrer os labirintos da sua vida e explorar novos espaços.

Critique todo pensamento negativo, toda ideia perturbadora, toda doença psíquica e toda passividade do “eu”. Um “eu “ passivo será sempre um escravo. Depois de exercer a arte da dúvida e da crítica, você preparou o seu “eu” para ser forte e determinante.

Determine ser feliz, ter tranquilidade e serenidade. Não peça para ser alegre, determine contemplar a beleza do mundo e ser feliz, mesmo que tenha muitos defeitos e inúmeros problemas. Dê-lhe um choque de lucidez e direcione-a, pois há uma força em cada pessoa subutilizada.

Duvidando, critancando e determinando, você passa a ser dono dos seus pensamentos e dos seus atos. Assim, com as rédeas nas mãos, pode praticar o autocontrole. Em outras palavras, o historiador Fields diz o mesmo. “Se a pessoa identificar o que gera essa raiva, é possível virar o jogo”. Quando a pessoa se torna consciente de que este gatilho vem de um instinto ancestral, ou de alguma coisa mal resolvida dentro de si, é mais fácil perceber que reagir raivosamente pode ser um exagero. “De repente, você percebe que isso não é motivo para briga – e o sentimento ruim vai embora”.

Entender como alguma coisa funciona sempre é o primeiro passo para usá-la melhor e ter controle sobre ela.

Vale o teste.

 

 

A autora, colaboradora

desta Revista, é jornalista

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