A personalidade e a saúde na longevidade
A personalidade de uma pessoa se desenvolve muito antes do início do envelhecimento. Sua formação depende das vivências e vínculos usufruídos e será determinante para a qualidade de vida durante o ciclo existencial. Em outras palavras, a saúde e a doença na longevidade não decorrem simplesmente porque a pessoa envelheceu, mas de como se preparou para aproveitar a velhice.
Conforme os estudos indicam, a importância da personalidade para a saúde está diretamente relacionada às características individuais e comportamentais, responsáveis pelo ajustamento da pessoa em seu ambiente e à utilização de defesas adequadas para lidar com conflitos, desafios e muitos outros fatores que envolvem o dia a dia das pessoas.
Cada indivíduo tem uma personalidade própria, resultante de uma equação composta por fatores genéticos, psicológicos, sociais e culturais, que definem um comportamento diferenciado para cada um. Não existem duas pessoas iguais, por isso o que é bom para alguns pode ser inadequado para outros. Tampouco podemos falar em um modelo comportamental melhor ou pior, certo ou errado. É o resultado positivo ou negativo das vivências, em maior ou menor grau de felicidade usufruído e possibilitado ao outro, que determinará a saúde física, psicológica e social da pessoa.
Os achados e pesquisas sobre a personalidade e o estilo de vida são variados, mas por consenso indicam que as pessoas mais velhas, desde cedo, manifestam seu comportamento futuro.
O desenvolvimento de recursos como a capacidade de resiliência e de reparação dos impulsos, frustrações, raivas, invejas e outros é o que vai auxiliar na elaboração de sentimentos desprazeiros e oportunizar o prazer e o bem-estar, evitando que as infelicidades, assim como os desconfortos e as ameaças, cheguem no envelhecimento roubando a saúde física e psicológica.
Diferentes tipos de personalidade fazem parte de uma população e dos membros de uma mesma família. Segundo alguns autores, a personalidade de uma pessoa geralmente reúne características diversas, mas na forma pura pode ser classificada como: adequada e adaptada (ao convívio com outras pessoas e o desempenho de papéis); agressiva (caracterizada por reações intensas de ataque e raiva); tímida (que inibe a comunicação e a aproximação); neurótica (cuja ansiedade se manifesta por condutas emocionalmente instáveis); ou excessivamente reservada (pela frieza e anti-sociabilidade).
Entretanto, podem ocorrer mudanças e aprimoramentos, isto é, aspectos da personalidade podem amadurecer e oportunizar a pessoa melhorar seu destino (tal como adotar um estilo de vida mais sadio e com melhores relacionamentos). Esses progressos é que farão a diferença entre a saúde e a doença, o companheirismo e a solidão no envelhecimento.
Muitos modelos de envelhecimento no passado entendiam que envelhecer bem e ter saúde envolveria uma atitude plácida e quase estóica em relação à vida, configurando estereótipos típicos de adultos maduros tranquilos, pacienciosos, resignados e cheios de sabedoria. Em outras palavras, ao envelhecer, as pessoas deveriam evitar complicar a vida e estarem disponíveis para servir, cuidar dos netos e demais familiares que solicitassem.
Esse abandono de si, anulando a própria personalidade, os desejos, não é um modelo de envelhecimento adequado e atual, principalmente para os que planejam uma longevidade com novos projetos e prazeres. A relação entre o estilo de vida e o bem-estar envolve variáveis diversas, e saber conviver com as diferenças que fazem parte da nossa sociedade, como a classe econômica, etnicidade, viuvez, as relações familiares, as finanças e muitos outros fatores que criam uma complexa rede de acontecimentos e pressões, exige explorar e aprimorar todos os recursos psicológicos que a pessoa dispõe.
Atribuir seus fracassos e infelicidades aos outros e anular-se perante as responsabilidades com seu futuro é desperdiçar a liberdade e a autonomia. A felicidade não reside somente nas famílias abastadas, sem problemas e dificuldades; ao contrário, existem pessoas envelhecendo muito bem que enfrentam dificuldades, mas convivem harmoniosamente numa relação de respeito e apoio com seus familiares.
A capacidade para amar não depende das condições socioeconômicas e culturais, mas da maturidade emocional adotada para administrar as ocorrências subjetivas, através dos recursos da própria personalidade.
Alguns estudos indicam que as pessoas raramente adquirem “maus hábitos” na velhice, sejam eles físicos ou psicológicos, (como é o caso do cigarro, da forma de administrar os conflitos, das indignações com a vida, do sedentarismo e outros). Também constata-se que, quando existe a determinação para mudar, os adultos maduros, em psicoterapia, demonstram melhores resultados e em menos tempo do que os jovens, indicando que a motivação (também parte da personalidade) é a responsável pela maior expectativa de vida e bem-estar físico e psicológico.
A consciência de que é possível ter uma longevidade com boa saúde física e psicológica exigirá um esforço constante, a iniciar muitas décadas antes da meia idade. As mudanças podem e devem ocorrer, e mesmo que haja algum declínio, não será o suficiente para impedir uma velhice produtiva e feliz.
Alcançar a longevidade com saúde pode ser considerado um prêmio, e todos indivíduos, desde os jovens aos mais velhos, têm o direito de usufruir disso. Portanto, conhecer-se, aprender a explorar os aspectos positivos da própria personalidade e corrigir os que não ajudam é uma tarefa constante, com resultados que podem ser medidos pela qualidade do envelhecimento desejado, uma vez que “na idade madura o corpo instrui a mente para ter paciência e tolerância, enquanto que a mente instrui o corpo na criatividade e na flexibilidade”, conforme nos diz William H. Thomas.