Artigos › 19/12/2023

EDUCAR SEM O USO DE APARELHO CELULAR É POSSIVEL?

A Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) afirma que o problema não é o uso, mas a intensidade com que é usado o aparelho celular.

 

Educar no século XXI parece impossível sem a sua intermediação. Não é o que parece para os pais Evandro e Giovana em relação à decisão de continuar a deixar as filhas sem o celular.

A mãe, Giovana Busanello, é formada em Matemática e pós-graduada na área. Trabalha há cerca de 20 anos no ramo bancário. O pai, Evandro Leonardi, é graduado em Filosofia com pós-graduação e trabalha na rede federal de educação. São os pais das meninas Maria Alice (10 anos), Ana Flávia (9 anos) e Cecília (6 anos).

A ascensão profissional e acadêmica dos pais foi em tempos de ausência das redes

sociais e das tecnologias. Por isso, eles têm buscado retardar a entrega de aparelhos celulares para as filhas, mas estimulam a ludicidade, criatividade, inventividade e a interação entre elas.

 

Contato com a natureza

Os pais não esperam que as filhas sejam as melhores alunas da escola. Desejam o estímulo de comunicação e de inserção social, gosto pela história e pelas estórias. A disposição em

alegrar-se por brincadeiras e ludicidades que não sejam intermediadas pela cultura tecnológica.

O filósofo Rousseau defendia uma educação com muito contato com a natureza até os idos da idade juvenil. “Temos percebido que o contato delas com a natureza é importante. Caminhadas em matas e cachoeiras, idas regulares nas chácaras dos familiares para apanhar ovos, brincar na terra e com os animais domésticos, se molhar, se sujar, “fazer arte”, escalar pequenos arbustos, acompanhar trabalhos simples dos avós. Receitas estas acessíveis no contexto de um município provinciano ao qual o cotidiano ainda consegue se mostrar bucólico e campestre. Esse cotidiano é, ao nosso ver, uma virtude e não um obstáculo”, destaca Evandro.

 

Herança cultural

O gosto pela leitura no lar foi se construindo de forma natural. A leitura dos pais na frente das filhas atiça o gosto. O pai é professor e acaba favorecendo a reprodução de estórias mitológicas, lendas, contos. A mãe conta estórias para as filhas antes destas dormirem, principalmente nas noites pré-letivas. Além disso e com a metodologia do reforço da catequese em casa, o contexto acaba oportunizando a leitura e compreensão de trechos bíblicos.

Os pais possuem uma formação privilegiada e essa herança cultural é transmitida na formação das filhas. Um privilégio social num país que perece diante de desigualdade social e concentração histórica de renda. “Adicionamos à educação das filhas, o senso crítico da história, do Brasil colonizado, das causas sociais e raciais presentes na sociedade. Procuramos sensibilizar sobre a questão dos refugiados e migrantes no município. Adicionamos à formação delas o senso crítico sobre o meio ambiente, o cuidado pela separação do lixo orgânico e reciclável, o contato com a água e com as nascentes, com a importância das árvores.

A constância nas celebrações religiosas na comunidade. Uma delas é coroinha na igreja matriz. Duas delas praticam o escotismo e participam de acampamentos externos. Essas saídas são um evento aguardado com entusiasmo, pois internalizam a socialização como ferramenta de vida”, frisa o pai.

 

Desejo das filhas

As filhas pressionam para ter um aparelho celular. “É uma espécie de guerra fria dentro de casa. Temos convicção de que nossa escolha melhorou até mesmo nossa relação enquanto casal. Com o tempo, embora estejamos inseridos cada vez mais na vida 4.0, temos observado que, para além dessa couraça chamada “mundo tecnológico”, existe vida de verdade em nossa casa”, confessou Giovana.

A superficialidade não pode e não deve sequestrar a verdadeira realidade humana. “As filhas têm contato com a televisão, desenhos, filmes, pequenas séries, músicas, vídeos inumeráveis de danças, mas trocam tudo isso rapidinho e sem pestanejar para que levantemos a casa para o ar se a pedida for diversão e brincadeiras. Haja costas para brincar de “torinho” e outras tantas maluquices. É dessa memória afetiva que lembram sempre e não por terem aprendido uma nova fase do joguinho na tela do celular da amiguinha ou do amiguinho”, conta o pai.

De acordo com os pais: “estabelecer fronteiras é uma chave fundamental para criar filhos. E assim pensamos e seguimos!”

Padre Judinei Vanzeto, SAC

O autor, colaborador desta Revista, é jornalista
e padre palotino em Coronel Vivida (PR)
jvanzeto@gmail.com

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